Enfim, dois: tensão marcou o debate até o sorridente abraço no final - Foto: Filipe Redondo/Band |
Sem direito de resposta, sem dedos em riste ou tons de voz elevados –
ao final do encontro, até um abraço em meio a sorrisos foi registrado
por câmeras de TV. Houve apenas um pico de agressividade no primeiro
debate de segundo turno entre Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB),
promovido nesta terça-feira (14) pela TV Bandeirantes. Foi quando o
tucano, confrontado com as denúncias de que construiu, como governador,
aeroportos que teriam beneficiado sua família em municípios de Minas
Gerais, dirigiu-se à presidenta e a chamou de “leviana”.
“Eu quero responder olhando nos seus olhos: a senhora está sendo
leviana, candidata, leviana!”, vociferou o senador do PSDB, para quem os
empreendimentos foram aprovados por órgãos competentes. “O Ministério
Público Federal atestou a regularidade dessa obra.” Aécio alegou ainda
que as terras que receberam os aeroportos foram legalmente
desapropriadas com vistas ao desenvolvimento local, em “região próspera,
onde estão mais de 150 indústrias” no interior de Minas. “Beneficiada
foi a população de Minas Gerais.”
A devolução do adjetivo pejorativo só viria depois de um intervalo do
debate, provavelmente por orientação de assessores (em tom moderado,
Dilma disse que Aécio é quem tinha sido leviano com sua resposta – em
seguida, abordou estrategicamente o tema violência contra a mulher e a
Lei Maria da Penha). Foi neste bloco, o terceiro do debate, que dois
temas começaram a sobressair em relação aos demais: a gestão do tucano
como governador de Minas Gerais e os elogios dele ao Bolsa Família, um
dos carros-chefe do governo petista – uma novidade do segundo turno, uma
vez que Aécio vinha abordando o assunto com cautela, diante de críticas
feitas ao programa, principalmente em redes sociais, por eleitores das
regiões Sul e Sudeste.
“Vamos fazer crescimento garantindo, sim, o avanço nas políticas
sociais. Eu não sei por que lhe incomoda tanto eu dizer aqui que no DNA
do Bolsa Família está, sim o PSDB”, disse Aécio, ao comentar o “discurso
do medo” de Dilma ao afirmar que o PSDB, uma vez eleito, colocaria fim a
programas em curso. O senador mencionou lei que determina a fusão, no
Bolsa Família, de outros benefícios sociais concebidos pelo seu partido.
Foi aí que citou Lula.
“E vou abrir aspas – é preciso generosidade, candidata – para o
presidente Lula no dia do lançamento do Bolsa Família: ‘Lembro aqui o
governador Marconi Perillo [Goiás/PSDB], faço justiça. Além de ser o
estado que mais tem essa política de renda, foi o companheiro que, na
primeira reunião de governadores que tivemos, sugeriu a unificação das
políticas de assistência social neste país’”, emendou o tucano.
Dilma reagiu prontamente. “De fato, candidato, o presidente Lula é
generoso. Mas o senhor está fabulando, está inventando uma história que
não existe. O Bolsa Família não tem nenhum parentesco com os programas
sociais dos governos tucanos”, disse a petista, passando a defender o
“quase pleno emprego” – “A menor taxa de desemprego das últimas três
décadas” – atingido em sua gestão, além de exaltar realizações como o
Pronatec (programa de ensino técnico e emprego).
Com cerca de uma hora e meia de duração, o debate mediado pelo
jornalista Ricardo Boechat teve quatro blocos de perguntas e respostas,
incluindo-se as protocolares apresentações individuais de abertura e as
considerações finais. Com apenas dois debatedores, simplificou-se a
hipótese de direito de resposta, só considerada em caso de ataque
pessoal ao fim de cada bloco, o que não ocorreu.
Alterosas
Com o discurso de que “não falar a verdade se
tornou a tônica” da campanha petista, Aécio teve de ouvir da
concorrente, logo na primeira intervenção do debate, que fracassou no
comando de Minas Gerais. Dilma declarou que os próceres da gestão
tucana, apenas no setor da saúde, “desviaram em torno de 7,6 bilhões – é
o que diz o Tribunal de Contas do Estado”. A petista disse ainda disse
que Aécio “foi contra o Mais Médicos”, e que a proposta do tucano para o
setor “inviabiliza” o programa. “O que o senhor acha de minha proposta
de criar o Mais Especialidades?”, quis saber Dilma.
“Lamento que a senhora esteja tão desinformada. Todas as nossas
contas, inclusive os investimentos em saúde, foram aprovadas pelo
tribunal de contas. A senhora se lembrará que antes da regulamentação da
emenda 29, que o seu governo demorou muito a conduzir no Congresso,
cada estado definia com muita clareza quais eram os investimentos na
saúde”, retrucou Aécio, acrescentando que o Ministério da Saúde petista
atestou Minas como o melhor serviço do setor na Região Sudeste. “Essa
proposta do Mais Especialidades é a nossa proposta. Agora, eu lamento
que a senhora só tenha se preocupado com isso quando seu governo
termina.”
Como fez em mais de uma ocasião, e até em entrevista ao final do debate, Dilma convocou eleitores a procurar os fatos em sites
oficiais. “Pode-se entrar no site do Tribunal de Contas de Minas Gerais
e lá vai estar claro que o Governo de Minas foi obrigado a assinar um
termo de ajustamento de gestão. Considerou-se que vocês desviaram em
torno de 7,6 bilhões da saúde. Aliás, em Minas Gerais vocês não cumprem
os principais programas que existem. O SAMU, por exemplo: vocês têm o
terceiro pior desempenho”, atacou a presidenta, referindo-se ao serviço
ambulatorial de urgência. “Vocês só têm [SAMU] em 28% dos municípios;
45% da população não tem.”
Fator Armínio
Diante dos ataques, Aécio não perdeu a oportunidade
de atacar os indicadores econômicos na gestão Dilma (para o tucano,
inflação alta, baixo desempenho da indústria, fuga de investimentos
etc). E o fez ao rebater declarações da petista exaltando geração de
empregos em tempos de crise internacional (“Uma reunião do G20 mostrou
que são 100 milhões de desempregados no mundo. Nós criamos, no mesmo
período, cinco milhões de empregos”).
“Precisamos recuperar a qualidade do emprego no Brasil – e não será
crescendo zero, como vamos crescer esse ano, que isso vai acontecer.
Lamentavelmente, candidata, o seu governo perdeu a capacidade de
inspirar confiança, de fazer com que os investimentos voltem ao Brasil.
Sem investimento, não há emprego, e os mais penalizados serão os mais
pobres, inclusive os detentores dos programas de transferência de renda.
O Brasil precisa encerrar essa fase”, fustigou.
Dilma havia feito críticas ao modelo econômico de Fernando Henrique
Cardoso quando lembrou que Aécio já indicou seu eventual ministro da
Fazenda – Armínio Fraga, presidente do Banco Central entre 1999 e 2003,
no primeiro mandato da gestão FHC. Era uma resposta à declaração de
Aécio de que o governo perdeu o controle da inflação, e Dilma claramente
se valia do lema da campanha petista (“quem conhece, não vota”)
direcionado não só à votação de Aécio em Minas, onde ele perdeu para a
presidenta, mas ao próprio legado do PSDB.
“Acredito que o senhor esqueceu o que ocorria no governo Fernando
Henrique Cardoso. O senhor indicou um ministro da Fazenda que, por duas
vezes, deixou a inflação superar o limite superior da meta: no primeiro
ano, foi 7,7%; no segundo ano, foi 12,5%. Nós investimentos
profundamente na criação de empregos, na valorização dos salários, na
estabilidade macroeconômica do país, diminuindo dívidas”, ponderou
Dilma, para quem a inflação estará em 6,5% “até o fim do ano”. “No
passado, as pessoas que procuravam emprego davam voltas no quarteirão,
como se diz em Minas Gerais.”
Aécio rebateu. “A verdade não pode ser alterada. Candidata, vamos ser
honestos, quando Fernando Henrique assumiu o governo, a inflação era de
916% ao ano. A senhora quer enganar a quem? Ela chegou a 7%, e aumentou
para 12% depois da eleição do presidente Lula”, disse. “Vocês,
candidato, gostam de cortar – e sempre cortam – empregos, salários”,
replicou Dilma, lembrando que Armínio deixou o cargo “um ano antes,
quando o presidente Lula ainda não era candidato oficial, e a inflação
chegou a 7,7%.”
Recuo
A temperatura dos ataques caiu no transcorrer do
debate, depois da citação dos aeroportos em Minas. Provavelmente
aconselhados por assessores a cada intervalo, tanto Dilma quanto Aécio –
até então o mais assertivo nas declarações – tentaram conter a
intensidade dos ataques. A tensão permaneceu no ar durante todo o
debate, mas, diferentemente dos outros encontros, o novo caso de
corrupção na Petrobras, por exemplo, foi pouco explorado por Aécio.
Por outro lado, Dilma passou a utilizar informações sobre a biografia
de Aécio, como as supostas ocorrências de nepotismo a beneficiar sua
família – prática que contrasta com o discurso do tucano sobre
“meritocracia” na administração pública, apontou a petista. Aécio então
desafiou Dilma a dizer onde sua irmã e braço-direito, a jornalista
Andrea Neves, estava trabalhando atualmente, e voltou a acusar a
campanha petista de se basear na mentira (“A senhora mente aos
brasileiros para ficar no governo”). Andrea integrou o Grupo Técnico de
Comunicação do Governo de Minas Gerais em 2003, no primeiro mandato de
Aécio.
“Recentemente, o Tribunal de Contas da União disse que, na refinaria
Abreu e Lima, quando a senhora era presidente do Conselho de
Administração da Petrobras – não fuja dessa responsabilidade –, foi
feito sobrepreço para pagar propina para partidos políticos que te
apoiam, para o seu partido”, atacou Aécio, no único bloco em que o
assunto voltou a ser abordado.
Dilma reaplicou a tese de que, em seu governo, tudo é investigado, ao
contrário do que acontecia, em sua opinião, nos oito anos de gestão
tucana. “Onde estão os envolvidos com o caso Sivam? Todos soltos. Os
envolvidos com a compra de votos da reeleição [de Fernando Henrique, nos
anos 1990]? Todos soltos. Os envolvidos na Pasta Rosa [caso referente a
financiamento de campanha]? Todos soltos. Os envolvidos no caso do
mensalão tucano? Todos soltos. O que eu não quero é isso, candidato. Eu
quero todos aqueles culpados presos”, sentenciou.
CongressoemFoco
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