O Senado tenta votar, nesta terça-feira (20), a ampliação para todas
as obras públicas sob responsabilidade de prefeituras, estados ou União
do sistema de licitações simplificadas, o chamado Regime Diferenciado de Contratações
(RDC). Ao contrário da Lei de Licitações, o regime dispensa a
existência de um projeto básico antes da concorrência. O governo, que
criou o RDC em 2011 para acelerar as obras da Copa do Mundo,
afirma que o novo modelo garante a entrega da obra. Como alternativa à
antiga Lei 8.666/93, o sistema é utilizado hoje em obras da Copa, das
Olimpíadas, da saúde e do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Passando pelos senadores, a proposta vai à sanção da presidenta Dilma
Rousseff.
Inicialmente, a Medida Provisória 630/14 permitia o uso da Lei
12.462/11 na construção de presídios. Mas modificação feita pela
relatora, a ex-ministra da Casa Civil Glesi Hoffman (PT-PR), ampliou o
RDC para quaisquer obras. A oposição e o Ministério Público, que
recorreu ao Supremo Tribunal Federal, enxerga na ampliação do RDC um
caminho para desvio de dinheiro e “compras abertas”. Ao lado deles, o
Conselho de Arquitetura de Urbanismo (CAU) e o Sindicato Nacional da
Arquitetura e da Engenharia (Sinaenco) criticam o método de contratação.
De acordo com Gleisi Hoffman, não há risco com a ausência prévia dos
projetos básicos. Isso porque o governo fará os anteprojetos de
engenharia. “O anteprojeto precisa ter a concepção da obra de
engenharia, os níveis de solidez e a segurança”, afirmou a senadora, que
administrou as obras do PAC quando estava na Casa Civil. Pelo RDC, é a
empreiteira que tem de fazer o projeto básico e apresentar o preço do
empreendimento. “A Lei nº 8.666, de 1993, tem se revelado um conjunto de
normas em muitos aspectos ultrapassado”, afirmou Gleisi em seu
relatório.
A senadora disse que os avanços tecnológicos permitem que os
anteprojetos sejam “melhores” que os projetos básicos feitos pelo
governo segundo as regras da Lei 8.666/93. Ela disse que os
anteprojetos, por terem concepção técnica, não permitem “o temor” dos
engenheiros e arquitetos. A relatora destacou que o RDC foi muito
utilizado nas reformas dos aeroportos. Gleisi leu decisão do Tribunal de
Contas da União (TCU), que determina abertura de licitação para obras
no aeroporto de Vitória (ES), “preferencialmente por meio do RDC”.
Porém, ela admitiu que os descontos nos valores das obras são menores
do que na lei tradicional. A senadora disse que o motivo é que os
preços no RDC são mais reais dos que os apresentados no processo comum.
“Dão desconto 20% e 30% para ganhar a licitação, mas depois exigem
aditivos de 50%. Quem paga é o contribuinte”, reclamou Gleisi.
Em seu relatório, a senadora diz que as licitações em aeroportos
levaram 53 dias em média para serem homologadas pelo novo regime no ano
passado. Já nas concorrências pela Lei 8.666, foram necessários 135
dias. No DNIT, as obras rodoviárias gastaram 379 dias com a contratação
integrada permitida pelo RDC. Pela lei atual, foram 774 dias, de acordo
com dados trazidos pela senadora.
Dinheiro para empreiteiras
O senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) estranha a ampliação do
sistema às vésperas. “É dar dinheiro para empreiteira em ano eleitoral”,
disse. O senador Randolfe Rodrigues (Psol-AP) concorda. Ele lembra que,
em 2011, o governo falava em exceção e agora quer generalizar o
sistema. “Diziam que era uma exceção à Lei de Licitações, só para Copa
do Mundo e Olimpíadas, por isso o nome ‘Diferenciado’”, destacou
Randolfe. “A exceção virou regra. Quem são os maiores financiadores dos
partidos políticos? Empreiteiras. É a esculhambação”, protestou. O
senador Pedro Simon (PMDB-RS) diz que a aprovação do sistema “significa a
extinção da Lei de Licitações”.
Critérios vagos
Na última quarta-feira, o senador Pedro Taques (PDT-MT) rebateu, um a
um, os argumentos de Gleisi Hoffman. Ele disse que simplesmente dizer
que o anteprojeto terá “concepção” é “dar voltas às palavras”. “Não há
norma que possa definir o que é o anteprojeto. A única definição são os
critérios vagos do art. 9º”, afirmou o senador.
Ele disse ser necessário buscar a redução dos prazos das licitações e
adotar uma “série de boas práticas” contidas no RDC, mas não a custa de
projetos mal feitos. “Elaborar projetos é demorado, mas é necessário,
senão a obra cai”, disse Taques, acrescentando a possibilidade de
fraudes e desvios de dinheiro.
O senador afirmou que os descontos exagerados de “aventureiros”
realmente ocorrem na lei atual. “Mas é exatamente o projeto que permite
avaliar proposta inexequíveis. Sem projeto,ficará muito mais
vulnerável”, avaliou Taques. Ele lembrou que artigo da lei do RDC
permite, sim, aditivos, alguns sem limite, ao contrário da antiga lei de
licitações.
A oposição não está sozinha. Desde 2011, o Ministério Público
questiona a lei no Supremo Tribunal Federal, alegando que ela permitiria
“graves desvios de dinheiro”. Em entrevista ao à Revista Congresso em Foco, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, diz que o regime é uma “compra aberta”, sem nenhum tipo de controle.
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