Ninguém se preocupa em ter uma vida virtuosa, mas apenas com quanto tempo poderá viver. Todos podem viver bem, ninguém tem o poder de viver muito.

Sêneca

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

“Negros e brancos são iguais no Brasil?”, por Juvenal Araújo

juvenal-araujo-tucanafro-300x200Sempre que fazemos a cobrança de ações que objetivam a inserção do negro na sociedade, ouvimos como resposta a citação decorada do artigo 5º da Constituição, o que diz que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Será que esse argumento é suficiente para derrubarmos a ideia de executarmos ações afirmativas no Brasil?

Segundo juristas como Marco Aurélio Mello, Joaquim Barbosa e Antonio Bandeira de Mello, o princípio constitucional da igualdade – o que está no artigo 5º da Constituição – se refere à igualdade formal de todos os cidadãos perante a lei. Mas a igualdade real, que significa a semelhança de oportunidades a todos (como também determina a Constituição, em seu artigo 3º) permanece como um objetivo a ser atingido. Por isso, as políticas públicas de afirmação de direitos são constitucionais e absolutamente necessárias.
Infelizmente, dados mostram que negros e brancos nunca tiveram condições iguais no Brasil. O Mapa da Violência 2012 deixa claro que a violência tem como alvo principal os negros – o número de homicídios de negros elevou-se 29,8% entre 2002 e 2010; como comparação, entre os brancos o indicador registrou diminuição de 25,5%.
 
Se restringirmos os dados somente à população jovem, veremos um impacto ainda maior. O número de jovens negros assassinados subiu 23,4% no período, e entre os brancos foi reduzido em 33%. Atualmente, existem 150% mais homicídios de negros do que de brancos.
Entre as mulheres, o problema também existe. O total de negras mortas corresponde a 61% das mulheres assassinadas. Estudo preliminar do IPEA estima que, entre 2009 e 2011, o Brasil registrou 16,9 mil feminicídios, ou seja, “mortes de mulheres por conflito de gênero”, especialmente em casos de agressão perpetrada por parceiros íntimos. Esse número indica uma taxa de 5,8 casos para cada grupo de 100 mil mulheres.

Quanto à questão Salarial do negro, um estudo divulgado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostra que um trabalhador negro recebe em média 36,1% a menos que um não negro, independentemente da região onde mora ou de sua escolaridade. A diferença salarial e de oportunidades de trabalho são ainda maiores nos cargos de chefia. De acordo com o Dieese, na Região Metropolitana de São Paulo, enquanto 18,1% dos trabalhadores não negros alcançam cargos de direção, apenas 3,7% dos negros atingem esta função.

Já a expectativa de vida em relação à violência, um estudo do IPEA conclui que, ao nascer, o negro tem 1,73 ano a menos de expectativa de vida no Brasil devido à “violência letal” (homicídios).  A média geral de expectativa de vida do brasileiro ao nascer, de acordo com o censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – no qual foi baseado o estudo do IPEA –, é de 73,5 anos. No caso dos negros, a violência faz esse número cair para 71,77 anos.

Apresentei esses dados com suas fontes para deixar claro que esta história de igualdade racial no Brasil só existe no papel.  Apesar de ser maioria da população brasileira, o negro sequer está presente nos cargos de primeiro escalão no Governo Federal e na quase totalidade dos governos estaduais e municipais. Não vemos o negro ocupando cargos como Ministro da Saúde, Ministro Chefe da Casa Civil, Secretário Estadual de Administração e Secretário Estadual de Governo. O negro só assume o poder em um secretaria ligada ao negro como a Secretaria de Igualdade Racial. Na visão da maioria dos governantes o negro tem que cuidar do negro. A participação do negro no Legislativo também é ínfima. Para a nação ser justa, deveríamos ter 51% de pretos no Parlamento. Na atual legislatura, dos 513 deputados federais apenas 43 (8,5%) se autodeclaram pretos. Infelizmente, as ditas minorias, que não são tão minorias, ainda estão fora do processo decisório da política brasileira.

Os negros no serviço público são minoria e necessitam de uma especial atenção na construção do poder social. Ocupamos sempre lugares de subordinação e nunca de comando. O número de magistrados e de representantes do Ministério Público é de uma pequenez aviltante.

Indicações de servidores negros para cargos e funções comissionadas são raras. Temos potencial, mas não temos padrinhos.

Mesmo as cotas raciais nas universidades, que já foram amplamente discutidas, ainda sofrem criticas severas. Os pobres e periféricos caminham na mesma trilha mesmo demonstrando e comprovando que são competentes. O destino é a exclusão.
A cada um de nós brasileiros, cabe o desafio de fazer com que pretos, pobres, periféricos, gays, lésbicas, amarelos, ricos, pobres, católicos, candomblecistas, evangélicos, indígenas, albinos, etc. sejam tratados com a igualdade preconizada na Constituição Federal.

Que possamos lutar por um BRASIL realmente democrático para que tenhamos mais advogados negros, mais magistrados negros, mais engenheiros negros, mais médicos negros, mais professores negros, mais delegados negros, mais representantes do ministério público negros mais parlamentares negros, mais ministros de estado negros, governadores negros, prefeitos negros de origem pobre e da periferia.


AVANTE  TUCANAFRO!!!
Juvenal Araújo é presidente do Tucanafro

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