Sempre
que fazemos a cobrança de ações que objetivam a inserção do negro na
sociedade, ouvimos como resposta a citação decorada do artigo 5º da
Constituição, o que diz que “todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza”. Será que esse argumento é suficiente
para derrubarmos a ideia de executarmos ações afirmativas no Brasil?
Segundo juristas como Marco Aurélio Mello, Joaquim Barbosa e Antonio
Bandeira de Mello, o princípio constitucional da igualdade – o que está
no artigo 5º da Constituição – se refere à igualdade formal de todos os
cidadãos perante a lei. Mas a igualdade real, que significa a semelhança
de oportunidades a todos (como também determina a Constituição, em seu
artigo 3º) permanece como um objetivo a ser atingido. Por isso, as
políticas públicas de afirmação de direitos são constitucionais e
absolutamente necessárias.
Infelizmente, dados mostram que negros e brancos nunca tiveram
condições iguais no Brasil. O Mapa da Violência 2012 deixa claro que a
violência tem como alvo principal os negros – o número de homicídios de
negros elevou-se 29,8% entre 2002 e 2010; como comparação, entre os
brancos o indicador registrou diminuição de 25,5%.
Se restringirmos os dados somente à população jovem, veremos um
impacto ainda maior. O número de jovens negros assassinados subiu 23,4%
no período, e entre os brancos foi reduzido em 33%. Atualmente, existem
150% mais homicídios de negros do que de brancos.
Entre as mulheres, o problema também existe. O total de negras mortas
corresponde a 61% das mulheres assassinadas. Estudo preliminar do IPEA
estima que, entre 2009 e 2011, o Brasil registrou 16,9 mil feminicídios,
ou seja, “mortes de mulheres por conflito de gênero”, especialmente em
casos de agressão perpetrada por parceiros íntimos. Esse número indica
uma taxa de 5,8 casos para cada grupo de 100 mil mulheres.
Quanto à questão Salarial do negro, um estudo divulgado pelo
Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos
(Dieese) mostra que um trabalhador negro recebe em média 36,1% a menos
que um não negro, independentemente da região onde mora ou de sua
escolaridade. A diferença salarial e de oportunidades de trabalho são
ainda maiores nos cargos de chefia. De acordo com o Dieese, na Região
Metropolitana de São Paulo, enquanto 18,1% dos trabalhadores não negros
alcançam cargos de direção, apenas 3,7% dos negros atingem esta função.
Já a expectativa de vida em relação à violência, um estudo do IPEA
conclui que, ao nascer, o negro tem 1,73 ano a menos de expectativa de
vida no Brasil devido à “violência letal” (homicídios). A média geral
de expectativa de vida do brasileiro ao nascer, de acordo com o censo
2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – no qual
foi baseado o estudo do IPEA –, é de 73,5 anos. No caso dos negros, a
violência faz esse número cair para 71,77 anos.
Apresentei esses dados com suas fontes para deixar claro que esta
história de igualdade racial no Brasil só existe no papel. Apesar de
ser maioria da população brasileira, o negro sequer está presente nos
cargos de primeiro escalão no Governo Federal e na quase totalidade dos
governos estaduais e municipais. Não vemos o negro ocupando cargos como
Ministro da Saúde, Ministro Chefe da Casa Civil, Secretário Estadual de
Administração e Secretário Estadual de Governo. O negro só assume o
poder em um secretaria ligada ao negro como a Secretaria de Igualdade
Racial. Na visão da maioria dos governantes o negro tem que cuidar do
negro. A participação do negro no Legislativo também é ínfima. Para a
nação ser justa, deveríamos ter 51% de pretos no Parlamento. Na atual
legislatura, dos 513 deputados federais apenas 43 (8,5%) se autodeclaram
pretos. Infelizmente, as ditas minorias, que não são tão minorias,
ainda estão fora do processo decisório da política brasileira.
Os negros no serviço público são minoria e necessitam de uma especial
atenção na construção do poder social. Ocupamos sempre lugares de
subordinação e nunca de comando. O número de magistrados e de
representantes do Ministério Público é de uma pequenez aviltante.
Indicações de servidores negros para cargos e funções comissionadas são raras. Temos potencial, mas não temos padrinhos.
Mesmo as cotas raciais nas universidades, que já foram amplamente
discutidas, ainda sofrem criticas severas. Os pobres e periféricos
caminham na mesma trilha mesmo demonstrando e comprovando que são
competentes. O destino é a exclusão.
A cada um de nós brasileiros, cabe o desafio de fazer com que pretos,
pobres, periféricos, gays, lésbicas, amarelos, ricos, pobres,
católicos, candomblecistas, evangélicos, indígenas, albinos, etc. sejam
tratados com a igualdade preconizada na Constituição Federal.
Que possamos lutar por um BRASIL realmente democrático para que
tenhamos mais advogados negros, mais magistrados negros, mais
engenheiros negros, mais médicos negros, mais professores negros, mais
delegados negros, mais representantes do ministério público negros mais
parlamentares negros, mais ministros de estado negros, governadores
negros, prefeitos negros de origem pobre e da periferia.
AVANTE TUCANAFRO!!!
Juvenal Araújo é presidente do Tucanafro
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